Todo fim de ano são publicados inúmeros relatórios de analistas de indústria, apontando as tendências para os próximos anos. O que fiz? Li a maioria deles e identifiquei que, com algumas pequenas variações, são muito parecidos. Mas, em conversas com diversos amigos senti que existe muita desconfiança em relação a essas tendências. Talvez porque muitos pensem em tendências como modismos e que, como tal, passarão rápido. Mas, em ciências, tendência signfica “uma direção geral na qual algo está se desenvolvendo ou mudando”. Por outro lado, existem dois tipos: as frágeis e as sólidas.
Uma tendência frágil é algo que pode acontecer, um futuro incerto, um talvez. Quase uma aposta. Mas uma tendência sólida é uma projeção baseada em fatos e eventos, tangíveis e perfeitamente mensuráveis. Assim, dos diversos relatórios, filtrei as tendências que me pareceram mais sólidas, fundamentadas em números e fatos concretos. A lista então se resumiu a cinco tendências: Cloud Computing; Mobilidade com dispositivos cada vez mais sofisticados; Mídias sociais; Consumerização de TI; e Big Data. Nada de novo. Coincide com a maioria dos relatórios. Mas gostaria de debater cada um deles um pouco mais exaustivamente.
Mas, antes de entrar na discussão, venho observando nos eventos dos quais participo e nas conversas com CIOs que está se alargando a distância entre o que os usuários desejam e usam em tecnologia e o que a área de TI realmente fornece. Se agruparmos as tendências acima, percebemos que elas estão modificando significativamente as plataformas de entrega de informações e os canais de comunicação e colaboração (cloud, mobilidade, mídias sociais e Big Data). Porém, o processo de mudança está sendo impulsionado pelos usuários (consumerização de TI), com as áreas de TI muitas vezes remando contra.
O gap entre os desejos dos usuários (e o que eles usam no seu dia a dia pessoal) e o que as áreas de TI permitem que eles usem nas empresas está aumentando. O setor de TI ainda é gerenciado pelos métodos tradicionais, como as práticas de gestão de projetos da década passada, com preocupações (algumas legítimas e outras nem tanto) de segurança, processos burocráticos e uma quase total aversão à introdução de inovações tecnológicas nas empresas. Claro que aqui estou generalizando, pois nem todas as empresas têm setores de TI reativos a mudanças, mas a percepção que tenho é que ainda existe muita aversão a mudanças dentro de TI.
Um exemplo: os usuários estão acostumados a acessar um app market e trazer para seu smartphone ou tablet aplicações fáceis de usar e intuitivas em suas interfaces. Mas os sistemas que usam internamente nas suas empresas têm interfaces complicadas e nada intuitivas. E são difíceis de ser instaladas e utilizadas. Precisam de servidores, um aparato tecnológico de middleware e semanas de espera para ter acesso aos aplicativos. Dois mundos diferentes.
Vamos às tendências. Cloud computing está se firmando como uma tendência bem sólida. Existe todo um ecossistema em torno, com muitos esforços e investimentos acontecendo ao seu redor. Muitas empresas já estão usando cloud em aplicações secundárias, embora as preocupações com segurança e as percepções quanto à confiabilidade das nuvens públicas ainda sejam meio duvidosas. Mas, vejamos o item segurança por exemplo: quantos data centers, principalmente das pequenas e médias empresas (e muitas grandes) têm políticas realmente adequadas e auditadas de segurança? Quantas têm modelos de governança em estágios aprimorados?
O que muitos dos gestores de TI dessas empresas têm é a enganosa percepção que tendo o servidor por perto os seus dados estarão seguros. Entretanto, acessos indevidos não são vistos a olho nu. Podem estar acontecendo nesse momento que o gestor olha para seu servidor. E esse acesso, invisível, nem deixa rastros. Por que acredito que cloud é uma tendência sólida? Os mesmos questionamentos aconteceram quando do surgimento do cliente-servidor e do e-commerce, que hoje são comuns. As percepções negativas serão resolvidas em pouco tempo e o nível de adoção deve acelerar exponencialmente nos próximos anos.
Um data center de um provedor de nuvem de âmbito global é muito mais seguro que um data center de uma pequena empresa. Existe 100% de segurança? Não, em nada veremos 100% de segurança. Mas, pensem em viajar de avião. A possibilidade de acontecer um acidente existe e é real, mas é baixíssima. Quando acontece fica na mídia por vários dias. Porém, no mesmo período, centenas de pessoas morrem em acidentes de trânsito e quase nada é publicado. Viajar de avião é muito mais seguro que viajar em um automóvel. As estatísticas confirmam isso.
Outro ponto para pensar: os benefícios de cloud vão muito além da proposta de redução de custos, pois permite a rápida criação de novos produtos e serviços e traz muito mais agilidade ao negócio (imagine dispor de uma aplicação em minutos ao invés de semanas). Recomendação: se você estiver planejando adotar cloud até o fim de 2012, comece agora a implementar seus primeiros projetos-piloto.
Outras tendências são a mobilidade e o crescente uso de smartphones e tablets. A capacidade computacional desses equipamentos está dobrando a cada ano e, se imaginarmos cinco ou seis anos à frente, teremos pelo menos uns quatro ciclos tecnológicos e isso significa que um smartphone ou tablet de 2016 terá pelo menos 16 vezes mais capacidade que os de hoje. Mas as empresas ainda relutam em aceitar de forma ampla esses equipamentos. Os setores de TI estão organizados pelo tradicional método de software on-premise e o modelo de app market é completamente diferente.
Por que as empresas não podem pensar em adotar o modelo de App Store para suportar os aplicativos dos smartphones e tablets de seus funcionários? Já começam a aparecer soluções no mercado que permitem criar e gerenciar essas lojas internas. Um exemplo interessante de caso real é o apps.gov do governo federal dos EUA, que é um App Store para aplicativos, que rode em ambientes de cloud, disponíveis para os órgãos governamentais americanos.
Interessante que outra tendência, mídias sociais, ainda gera controvérsias. Os números são impressionantes: 30 bilhões de peças de conteúdo foram adicionadas ao Facebook mês passado, mais de 2 bilhões de vídeos foram vistos no YouTube, ontem. Cada adolescente, em média, envia quase 5 mil mensagens SMS por mês, e no último mês mais de 32 bilhões de pesquisas foram efetuadas no Twitter. Mas, apesar desses números, muitas empresas não liberam seu uso pelos funcionários. O que essas restrições acabam gerando? Os funcionários usam as mídias sociais por conta própria, por meio de seus smartphones e tablets, “bypassando” a área de TI. E, pior, volta e meia ouço alguém dizer que mídia social não é da competência do setor de TI e que deve ser um setor a parte. Se a área de TI entender dessa maneira estará tomando suas primeiras pílulas de cianeto.
Big Data está se delineando no horizonte. Uma simples pesquisa usando “Big Data” no Google me traz mais de 11 milhões de hits. Um tsunami em alto mar não é facilmente reconhecível, mas ao chegar à costa causa uma devastação imensa. Big Data é um tsunami ainda longe da costa, mas com a velocidade com que está correndo, em muito pouco tempo estará entrando empresa a dentro. Se a área de TI não se preparar, vai ser terrivelmente afetada pelos seus efeitos.
Big Data deve ser visto como um efeito multiplicador de três variáveis ou três “Vs”: Volumes de dados cada vez maiores (gerados por sistemas corporativos, mas também por mídias sociais e sensores e outros dispositivos), Variedade (dados estruturados e não estruturados, como os obtidos dos twitters e facebooks e de câmeras de vigilância), e Velocidade, pois demanda uma resposta quase em tempo real para agir no próprio evento gerador das informações. O modelo atual de análise de dados, baseado em data warehouse e BI, olha para os dados do passado e não reconhece o que está sendo gerado nesse exato momento.
E, finalmente, a quinta tendência, que é a impulsionadora das demais dentro das empresas: a consumerização de TI. As novas tecnologias chegam às empresas impulsionadas por seus funcionários e clientes e não pelas áreas de TI. O setor de TI já não é mais o setor inovador na empresa. O efeito? A criação do fenômeno do “shadow IT” com os usuários “bypassando” TI onde puderem. Para fazer frente à rapidez com que essas novas tecnologias entram nas empresas, o setor de TI deve ser reengenheirado. Não pode mais se agarrar aos métodos e aos processos criados na década passada (na era PC) e que mantêm até hoje, no mundo pós-PC. Tem de se atualizar frente aos novos cenários. Isto implica em novos modelos de governança (mais descentralizados) e incentivar a adoção de novas tecnologias (os usuários o farão sem TI). Em resumo, TI deve assumir o papel de liderar o processo de inovação e não ser a barreira para a adoção dessas tecnologias.
O mundo pós-PC implica em mudanças culturais significativas no setor de TI. Começaremos a ver, com ou sem apoio de TI, movimentos como BYOD (Bring Your Own Device) para tablets e smartphones, seguidos por BYOC (Bring Your Own Cloud) e BYOA (Bring Your Own Application). Parece inimaginável pensar dessa forma. Mas há meros seis ou sete anos quem pensava em um iPhone? Ou em um tablet? Em 2007, surgiu o iPhone e em 2009, o tablet, e em poucos anos estarão vendendo muito mais que os PCs que surgiram 30 anos atrás.
Portanto, avaliar as tendências não significa apenas ler os vários relatórios e voltar a olhar o dia a dia, sem pensar nas consequências que elas trarão para as empresas e para o setor de TI. Assim, se TI quiser manter sua importância na empresa, e não se tornar um mero setor operacional, deve prestar atenção aos impactos que essas tendências trarão nos hábitos e demandas das empresas e seus funcionários. A sugestão é simples: reengenheirar o setor de TI para se adequar ao mundo pós-PC. Um setor de TI agarrado ao mundo PC, ignorando todas essas tendências sólidas, está caminhando para o desaparecimento. Vai voltar a ser o velho e obsoleto CPD.
FONTE: CIO UOL