“Inovar para competir. Competir para crescer”. O slogan do Plano Brasil Maior (PBM), lançado no começo de agosto pela presidente Dilma Rousseff, estabelecendo diretrizes para a nova política industrial, tecnológica, de serviços e de comércio exterior para o período de 2011 a 2014, está em linha com a principal exigência do mercado global e também dos consumidores. No atual cenário econômico, inovar tornou-se essencial para o sucesso de qualquer negócio.
O PMB concebido para aperfeiçoar medidas da Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE –2003/2007) e Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP – 2008/2010), engloba ações para fortalecer a empresa nacional no mercado doméstico e externo. Tem, em seu universo, forte estimulo à inovação para transformar boas ideias em produtos e serviços e, assim, tentar aumentar a competitividade da empresa nacional.
Segundo Dilma, o PBM aprimorou o marco regulatório da inovação e cria ações para estimular o crescimento de pequenos negócios no Brasil, por meio da ampliação de linhas de financiamento. O plano regulamentou também a lei de compras governamentais que prioriza companhias nacionais nas licitações. Outra medida de impacto é a desoneração da folha de pagamento, prevista para entrar em vigor em outubro.
Ainda há muitas dúvidas sobre os cronogramas do PBM, mas na área de TI é difícil encontrar um empresário que não tenha aprovado as medidas. Se serão suficientes, é outra discussão. O fato relevante é que inovação, agora, faz parte da agenda nacional, creem os mais otimistas. “O tema entrou na nova política industrial pela porta da frente”, analisa o gerente de Política Industrial e Inovação da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Paulo Mol.
Para o consultor em inovação Valter Pieracciani, sócio-diretor da Pieracciani Desenvolvimento de Empresas, o Brasil percebeu que investir nessa área é o caminho para evitar a desindustrialização e a perda de capital intelectual. Ele é coordenador do grupo técnico de Sistemas de Gestão da Inovação na Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), e constata que o País vem falando muito do assunto desde o ano 2000, sem ações práticas. Havia muitas indefinições.
Dados do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) revelam que o Brasil investiu 24,2 bilhões de dólares em P&D em 2010, o equivalente a 1,19% do Produto Interno Bruto (PIB). O ministro Aloizio Mercadante reconhece que esse valor ainda é baixo se comparado aos volumes aplicados nessa área nos Estados Unidos, Japão, China e Alemanha.
“Precisamos de mais inovação para termos produtos com maior valor agregado e deixarmos de exportar commodities”, diz ele que considera o empresário brasileiro ainda tímido com o processo de inovação. Em países mais avançados nessa área os investimentos das empresas em P&D ultrapassam os volumes aplicados pelo governo, enquanto que no Brasil os dispêndios entre ambos estão quase que no mesmo nível.
Na opinião de Pieracciani, agora o Brasil tem de correr para recuperar o terreno perdido para países que vêm investindo há mais tempo em inovação, como é o caso da Coreia, que tomou essa decisão há 30 anos e hoje é um dos centros globais de indústrias de tecnologia.
E vai além: o Brasil terá de criar uma estratégia de conselhos de inovação, como acontece em outros países e seguir o modelo da China em centros de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) que se instalam lá, se quiser se tornar realmente uma potência tecnológica. “Quando a China aceita uma empresa, ela exige a transferência de conhecimento para profissionais locais”, diz o especialista, citando o caso da Embraer, que para operar lá, aceitou que chineses ficassem colados aos pesquisadores brasileiros para aprenderem sobre a tecnologia da fabricante de aviões. Acontecerá o mesmo aqui com as fábricas de displays que negociamos com os chineses?
Nessa primeira fase, o PBM contempla apenas quatro setores da economia, mas o ministro Fernando Pimentel, do Ministério de Indústria Comércio e Relações Exteriores (MDIC), sinaliza estender em 2012 os benefícios para outros setores. Além de TI, a nova política atende às indústrias de calçados, confecções e móveis, que foram penalizadas pelo cambio e tiveram exportações impactadas. O setor de TI, por exemplo, fechou 2010 com negócios no mercado externo abaixo do esperado. A projeção de faturamento era de 3,5 bilhões de dólares e a receita ficou em 2,4 bilhões de dólares.
A expectativa do mercado é de que o programa ofereça os instrumentos necessários para que o Brasil consiga atrair centros de pesquisas e desenvolvimento (P&D) de empresas internacionais. Espera-se também que haja mais incentivo para projetos criativos para que o País consiga dar um salto em inovação e se desenvolver economicamente. Durante a apresentação do PBM, a equipe ministerial de Dilma garantiu aumento de recursos para financiar projetos diferenciados.
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social (BNDES) vai repassar 2 bilhões de reais à Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), órgão de fomento do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), para financiar projetos inovadores. O banco também estendeu para até dezembro de 2012 o Programa de Sustentação do Investimento (PSI), que tem orçamento de 75 bilhões de reais. O PSI incluirá novos programas para componentes e serviços técnicos especializados; e equipamentos de Tecnologias da Informação Comunicação (TICs) produzidos no País.
Na tentativa de estabelecer uma política de inovação articulada entre setor privado, público e universidades, o MCTI está traçando a segunda edição do Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação (PACTI 2) para o período de 2011-2014. O plano contará com medidas para expandir a área de P&D no Brasil. Já foi anunciado o aumento em 50% dos recursos da Finep para financiar projetos nessa área.
O orçamento para P&D para 2011 passou de 4 bilhões de reais para cerca de 6 bilhões de reais. Outro plano do MCTI é transformar a Finep em um banco público de inovação. O projeto ainda depende de aprovação do Banco Central do Brasil. A mudança tem o objetivo de reduzir as barreiras para repasse de recursos a projetos de inovação nas pequenas e médias empresas, que hoje têm dificuldade para serem atendidas pelo BNDES.
De fato, estamos diante de um pacote de medidas que pode ajudar o Brasil a melhorar sua posição no ranking mundial de inovação. O Brasil subiu 21 posições no Índice Global de Inovação de 2011, medido pela Insead (The Business School for World), em 125 países que respondem por 98% do PIB mundial. Mas a classificação do Brasil ainda está longe das dez nacões mais inovadoras.
No ano passado, o Brasil estava em 68o lugar e agora ocupa o 47o posto. O País pode avançar mais nessa área se o PBM surtir efeito.
Barreiras para inovação
Com a inovação ganhando mais corpo no Brasil, empresários esperam também a redução das barreiras para que as boas ideias sejam colocadas em prática. O gerente de Política Industrial e Inovação da Confederação Nacional da Indústria (CNI) avalia que as empresas brasileiras investem menos nessa área em comparação com a de países mais avançados, não porque os empresários são menos criativos, mas devido aos obstáculos.
Mol cita a burocracia do ambiente de negócios no Brasil, que consome muito tempo dos empresários com as atividades operacionais, como um dos maiores problemas. Outro é a dificuldade para obtenção de dinheiro. Aponta como exemplo o atraso da Finep na liberação de recursos do Programa de Subvenção Econômica de 2010.
O vice-presidente da Associação das Instituições de Pesquisas Tecnológicas (ABIPTI) para região sudeste, Paulo Roberto Santos Ivo, informa que a Finep conta com 14 fundos setoriais para financiar inovação, mas aponta dificuldade para conseguir aprovação dos projetos. O Instituto Eldorado, por exemplo, teve apenas seis projetos financiados em oito anos, entre cerca de 40 propostas submetidas ao órgão.
Na opinião do vice-presidente de Relações Públicas da Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação, Software e Internet (Assesspro), Roberto Mayer, o maior obstáculo para conseguir recursos da Finep é que a chamada do edital é anual. Ele constata que em outros países, como a Espanha, as chamadas de inovação não têm datas fechadas.
“O empresário precisa de financiamento quando a luz da boa ideia acende”, afirma, Mayer, lembrando que a inovação é o motor da indústria de TI e as que se mantêm competitivas são as que conseguem se renovar constantemente.
O presidente da Finep, Glauco Arbix, responde aos empresários que o edital da subvenção de 2010 está no prazo e atribui à demora na divulgação dos resultados dos projetos contemplados à legislação. “Com a legislação atual, ninguém faz subvenção em menos de um ano, pois é necessário respeitar o tempo de cada fase, inclusive os prazos dos recursos, instrumentos intensamente usados pelos empresários”, diz o sociólogo e professor que está à frente do órgão de fomento desde janeiro deste ano.
Arbix afirma que como o dinheiro é escasso, há muita competição entre as empresas para obtenção de financiamento dos projetos, gerando contestações. “Sou obrigado, a cada fase, abrir o recurso e julgá-los, antes de seguir em frente”, acrescenta.
O professor garante que o edital de 2011 sairá até o final do ano e justifica que não foi lançado ainda porque a definição orçamentária da Finep saiu somente em maio. Essa indefinição, segundo ele, paralisou outros programas de fomento da agência.
Arbix reconhece que os processos para liberação de financiamento para projetos de inovação são lentos, mas argumenta que 90% dos problemas ocorrem por causa das regras para concessão de dinheiro público ao setor privado. “Não quero dizer com isso que não haja ineficiência da Finep”, afirma.
Para tentar mudar o quadro, a Finep propõe modificações no marco legal de inovação em discussão no Congresso Nacional. Uma das sugestões é a ampliação dos fundos setoriais e novos mecanismos para facilitar o financiamento. Hoje, cada programa de repasse de recursos segue um ritmo diferente, dificultando a realização dos projetos.
O novo marco propõe ainda a criação da Fineppar, com modelo parecido ao do BNDESpar, que permitirá à agência de fomento participar de empresas inovadoras de base tecnológica. São mudanças que vão alterar leis como as de Informática e da Inovação. Porém, tudo dependerá de como a proposta caminhará na Câmara e Senado.
Falta de sintonia
A tímida interação entre universidades e iniciativa privada também atrapalha nos processo de inovação. Frederico von Ah, gerente sênior de Incentivos Fiscais para Pesquisa e Desenvolvimento da consultoria KPMG, afirma que o tripé empresa, instituição de ensino e governo tem de se fortalecer para reduzir a lacuna tecnológica do Brasil em comparação com os países desenvolvidos.
“Nos Estados Unidos, por exemplo, a interação governo-indústria-empresa é bastante desenvolvida. O papel do governo é o de fornecer o ambiente para que a relação universidade-empresa seja a melhor possível”, assinala von Ah. Não só no continente americano, mas a combinação de excelência acadêmica e competência empreendedora é comum em grande parte das instituições de pesquisa bem-sucedidas, completa.
“A saída para driblar a burocracia é fazer cartas de intenção, uma pré-formalidade, para entender o que a empresa quer que a universidade ofereça. Falta diálogo”, aponta o executivo da KPMG.
Na visão de Inomar Mourão Gil Nunes, coordenador de Inovação e Internacionalização da Fumsoft – que atua na criação, capacitação, qualificação e fomento de empreendedores e organizações produtoras de software de Minas Gerais –, a colaboração entre universidades e empresas tem-se tornado importante mecanismo de negócios e de acesso à tecnologia e a novos mercados.
“Não é o governo que vai incentivar essa relação na canetada, é a comunidade acadêmica e empresarial com essas interações”, diz Nunes.
Entre os especialistas do tema, há um consenso de que por aqui, nas últimas décadas, cresceu o esforço para a formulação de políticas públicas, iniciativas, planos e marcos regulatórios, que buscam estimular as parcerias público-privadas para potencializar o desenvolvimento econômico e social a partir do conhecimento, da tecnologia e da ciência no Brasil.
Uma das iniciativas é o Sistema Brasileiro de Tecnologia (Sibratec). Criado pelo governo federal, ele é formado por 56 redes de núcleos de pesquisa e desenvolvimento, sendo 14 centros de inovação, 20 de serviços tecnológicos e 22 de extensão organizadas nos estados.
Em relação ao fomento para projetos, em 2009, a Finep liberou para editais 390 milhões de reais. E o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) direcionou 736 milhões de reais, no período 2008-2009, para editais de apoio à pesquisa em todas as áreas do conhecimento, sendo que grande parte para os Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia.
“No entanto, ainda hoje poucas companhias estabelecem vínculos de cooperação com outras ou com universidades e institutos de pesquisa”, afirma Roberto de Alencar Lotufo, diretor-executivo da Agência de Inovação Inova Unicamp.
FONTE: CIO UOL