Autor: Bruno Garcia
As marcas precisam lidar com um novo perfil de consumidor em plataformas online, os chamados “onívoros” digitais. Uma presença multiplataforma será cada vez mais exigida pelo público, bem como ações integradas que contribuam para a construção de valor e de marca. Outro ponto que demandará uma adaptação das empresas é a evolução dos indicadores usadas para medir o desempenho das ações na web e no mobile. O tradicional foco em cliques, pageviews e exibições dará lugar a índices mais ligados ao contexto, olhando para o diálogo e o nível de envolvimento atingido com o usuário. Estes são alguns dos pontos apresentados pela ComScore em seu estudo sobre tendências no digital para a América Latina.
O continente desperta especial interesse das companhias globais pelo potencial de crescimento que ainda possui no ambiente virtual. Os usuários latinos se destacam em diversos aspectos. Dos 10 mercados mundiais com usuários mais engajados nas redes sociais, três estão na América Latina: o Brasil aparece em terceiro lugar, com média 13,9 horas mensais de uso por pessoa; Argentina em sexto, com 9,2 horas; e o Peru em nono, com 8,1 horas mensais. O ritmo de crescimento dos usuários entre os latinos também é mais acelerado: entre 2012 e 2013, enquanto a média mundial de aumento de pessoas usando plataformas sociais foi de 10%, o salto foi de 22% no continente sul americano.
No comércio eletrônico, a região também se destaca: o número de e-consumidores aumentou em 10% no período de 2012 a 2013, enquanto a média global foi de 7%. Para aproveitar este potencial, as empresas precisam modificar sua forma de atuação, migrando de modelos tradicionais que foram importados da mídia eletrônica e impressa, para novos indicadores de performance, baseados no comportamental. “O desafio é medir efetivamente o que importa. Nesse caso, já não interessa tanto a quantidade de impressões ou de cliques, mas sim se as pessoas certas estão acessando estes conteúdos”, explica Marcos Christensen, Country Manager Argentina & Uruguay da ComScore.
Relacionamento estará fragmentado entre diversas plataformas
O levantamento da ComScore aponta para um perfil de usuário que estará apto a entrar em contato com a marca e consumir seus conteúdos por todas as plataformas que estiverem disponíveis. O acesso digital a partir de outros dispositivos, que vão além de smartphones e tablets, vem crescendo e ganhando destaque. Em países como México e Chile, o tráfego gerado por outros aparelhos já soma quase 15% de tudo o que é acessado na internet. No México, em especial, a navegação por PCs e notebooks representa 85% do total, smartphones 10,6%, tablets 3,6% e outros, 0,9%. No Chile, a proporção é de 87% para PCs e notes, 11% para smartphones, 1,7% para tablets e 0,3 para outros. O Brasil ainda apresenta uma divisão mais tradicional: 92,1% para PCs e notes; 5,8% para smartphones; 2% para tablets e 0,1% para outros devices.
Para os próximos anos, o relatório aponta para uma divisão mais equilibrada entre as plataformas, com o destaque para o crescimento cada vez mais rápido de smartphones, tablets e outros aparelhos, como smart TVs, set top boxes, videogames e outros gadgets que ganhem acesso à web, como smartwatches e Google Glass. “Não existirá mais o ato de se conectar. As atividades que se realizam nas plataformas digitais começam a surgir como a extensão do pensamento e incorporam-se ao cotidiano e às necessidades básicas do indivíduo. São impulsos de conseguir informação imediata, de opinar, de auto-expressão, de consumo de um conteúdo específico naquele exato momento e, sobretudo, de se comunicar”, avisa Leonardo Carrilho, Gerente de Mídia Digital da NBS, em entrevista ao Mundo do Marketing.
Para atender a estes “onívoros” digitais, as marcas precisam de estratégias adaptadas a cada plataforma, criando relevância e engajamento nos diferentes ambientes. “Não se trata de uma duplicação dos mesmos conteúdos e não é necessário que todos os serviços como atendimento, vendas, relacionamento, entre outros, sejam executados em todas ao mesmo tempo. É indispensável que se mostre às pessoas que existem canais apropriados e eficientes para lidar com cada uma dessas demandas ou estas expectativas frustradas vão ‘tumultuar’ as agendas positivas das marcas com seus consumidores, transformando estes que seriam canais proprietários de comunicação em verdadeiros muros de lamentações”, comenta Leonardo Carrilho.
Gerando valor e experiência no digital
O usuário multiplataforma vai exigir mais entrega de valor e de experiências pelas interfaces digitais. Ao contrário do que se verifica atualmente, as marcas precisam mudar o foco de gerar leads e vendas para a construção de um relacionamento contínuo e que deve estar integrados a todas os canais onde a empresa estiver presente. “O consumidor está em múltiplas plataformas, mas será que ele está consumindo qualquer coisa? Acredito que não. Precisamos entender que o consumo não é do digital em si, mas de valores e experiências que a marca proporciona. As marcas têm que se posicionar como agregadoras de valor por meio do conteúdo, e facilitadoras da experiência por meio de processos. E tudo isso tem que ser relevante para o e-consumidor”, argumenta Klaus Rabello, Professor da ESPM, em entrevista ao portal.
As companhias costumam ser rápidas para ocupar esses novos espaços, mesmo sem os conhecerem ou entenderem por completo. E a presença “estanque” nos múltiplos canais não garante uma estratégia integrada. “As marcas brasileiras precisam romper dificuldades mais elementares para usufruir minimamente desta tendência. Em todos os países em que a penetração dos meios digitais atingiu 40% da população, houve um crescimento acelerado nos níveis de investimento. Temos percentuais do bolo publicitário acima dos 30% em países como Inglaterra, Estados Unidos e Japão. No Brasil, existe uma dificuldade em enxergar a Internet como meio de massa. Dessa forma, as oportunidades trazidas por estes dispositivos estão longe de um uso consistente”, acrescenta Leonardo Carrilho, Gerente de Mídia Digital da NBS.
A experiência deve ser integrada, inclusive, com os canais tradicionais, como o SAC e o atendimento no ponto de venda. O relatório da ComScore aponta para a eliminação das barreiras que hoje separam o físico e o digital. Como isso ainda não acontece, na prática o com consumidor vive um diálogo “esquizofrênico” com as marcas. “O exemplo mais evidente é que quando o consumidor vai no Twitter, no SAC ou na loja física, parece que são marcas diferentes e em todas elas, o cliente não é alguém conhecido. O grande desafio é sobre como manter os valores da marca convergentes em todos esses canais”, diz Klaus Rabello, da ESPM.
Fim da ditadura do clique
Outro ponto levantado pela ComScore fala da evolução dos indicadores de performance no digital e até de uma possível unificação entre as métricas usadas nestes ambientes e nas mídias tradicionais. “O mercado está caminhando para o mesmo tipo de métrica. A partir do momento em que se adota uma única variável para todas as plataformas, e isso está sendo encampado pelos players bem importantes, como o Google por exemplo, o cenário começa a se alterar. A que volume de pessoas chegamos e quantas vezes os impactamos? É isso que o anunciante quer saber e as plataformas, por sua vez, estão cada vez mais focadas em entregar performance. É o fim da ditadura do clique”, avisa Marcos Christensen, Country Manager Argentina & Uruguay da ComScore.
Entre todas as tendências, esta talvez seja uma das que ainda depende de mais tempo e amadurecimento, inclusive dos profissionais e empresas que lidam com o setor. “Em termos digitais, temos uma divisão clara entre especialistas e leigos, com pouquíssima representatividade em uma camada intermediária importantíssima de profissionais não-especialistas. Aqui não faço isenção, referindo-me a agências, anunciantes, veículos de comunicação e demais envolvidos nesse ecossistema. É preciso evoluir em todas as pontas”, argumenta Leonardo Carrilho, da NBS.
As organizações também precisam ter maior clareza de objetivos. Isso garante a definição de KPIs adequados. “Já existem, ainda que de forma tímida, estratégias e possibilidades técnicas para promover a leitura de métricas de forma integrada, mas que dependem de condições ideais no back-office e de criatividade na tática no front para fazer funcionar. Claro que hoje já se cruza a intensidade de mídia na TV com o tráfego no site e já se trabalham filtros específicos para identificação da origem de volume de ligações e suas subsequentes conversões no call center, mas a visão global de todo esse esforço para o resultado imediato de vendas e para os ganhos diversos de médio e longo prazo ainda é um luxo para poucos”, acrescenta o executivo da NBS.
FONTE: Mundo do Marketing