Outro dia me dei conta de quão profunda é a transformação digital que vivemos. Este insight surgiu quando me dei conta de que estava assistindo televisão, falando com um amigo no Skype, mantendo três ou quatro chats simultâneos no Facebook e usando o Google para algumas pesquisas que complementavam estas conversas. Tudo isso ao mesmo tempo, enquanto buscava comprar uma TV LED. E eu não sou um nativo digital, que multitarefa muitas vezes mais.
A realidade é que hoje estamos conectados digitalmente desde que acordamos até a hora de dormir, absorvendo e gerando um volume muito grande de conteúdo. Este fenômeno acontece no nosso dia a dia, seja ele em casa ou no trabalho. Aliás, esta é outra transformação. Fica cada vez mais dificil separar o “em casa” do “no trabalho”.
A computação está se tornando tão ubiqua que se torna praticamente impossível separar o mundo fisico do digital. Nos anos 90 (e isso tem menos de 20 anos), apenas os setores digitalizáveis, como música e mídia, tornaram-se digitais. No início dos anos 2000, o mundo físico se aproximou mais da digitalização com o comércio eletrônico e o “Internet Banking”. Hoje estamos começando a ver claros sinais da hiperconectividade, com cloud computing, revolução da mobilidade e Internet das Coisas permeando nossa sociedade. Nossos hábitos como pessoas conectadas tornam-se hábitos como consumidores (checamos preços e avaliações antes de qualquer compra), e tornam-se também hábitos como funcionários (porque sou impedido de me conectar com os meus amigos via Facebook no escritório?).
Hoje quase um em cada sete habitantes do planeta está no Facebook. As plataformas de mídias sociais estão potencializando as nossas conexões. O Facebook não é apenas brincadeira de adolescentes ociosos. Pesquisas mostram que 72% da geração “baby boomer” já está nas mídias sociais. A propósito, recomendo a leitura do paper que analisa este impacto, chamado de “From social media to Social CRM”.
O volume de informações geradas pela sociedade é assustador. O Twitter, por exemplo, gera sozinho 12 terabytes de tuites por dia. Os medidores inteligentes de energia, que começam a substituir os seus ancestrais analógicos, geram 350 bilhões de medições por ano. E apenas uma pequena parcela das casas no mundo já possui estes medidores. Em 2010, Eric Schmidt, então CEO do Google, disse que a cada dois dias a sociedade já gerava tanta informação quanto gerou nos seus primórdios até 2003, ou seja, 5 hexabytes.
Smartphones e tablets já são lugares comuns e surgiram há muito pouco tempo. O iPhone apareceu em 2007. Em março, a AppStore, da Apple, alcançou a marca dos 25 bilhões de downloads de aplicativos. Em setembro foi a vez do Google Play.
A mobilidade elimina as barreiras de tempo e espaço. As pessoas (leiam-se os consumidores ou, melhor, os clientes), estão conectados todo o tempo, e as empresas têm a oportunidade de estarem em contato com eles também todo o tempo. Uma pesquisa da IBM com 30 mil consumidores em 13 países mostrou que entre 78% e 84% deles se baseavam nas mídias sociais quando pensavam em comprar produtos: 45% pediam opinião de amigos e/ou parentes e apenas 18% se baseavam nas informações dos produtores e varejistas para a tomada de decisão. A conexão com o cliente é mais que uma comunicação unidirecional. Não é mais suficiente apenas conectar-se a ele, mas é necessário integrá-lo aos processos de negócio e trazê-lo para dentro de casa.
O que isto significa? Que as informações sobre os produtos estão se tornando mais importantes que os produtos em si. Portanto, praticamente todas as empresas têm que gerar conteúdo. Se o conteúdo gerado para a tomada de decisão de compra de um determinado produto não for adequado, a tendência da compra ser direcionada a outro produto torna-se bem maior.
Subestimar o impacto das transformações digitais pode colocar em risco o negócio, por mais sólido que ele pareça. Um exemplo é a indústria fonográfica, que subestimou o poder da digitalização, ignorando que as conexões de banda larga ampliavam sua capacidade, o surgimento do padrão MP3 e os avanços tecnológicos que aumentaram de forma significativa a capacidade computacional dos chips, ao mesmo tempo em que a tecnologia se desmaterializava. O resultado foi que, de 2003 a 2012, o total da receita das gravadoras caiu de 12 para 8 bilhões de dólares. Por outro lado, a indústria da música como um todo gerou muito mais dinheiro, mas este dinheiro foi deslocado para outros atores do ecossistema que não as gravadoras, como produtores de shows, fabricantes de tocadores MP3 e assim por diante.
O que fazer diante desta revolução digital? As empresas podem ficar paradas, esperando que as transformações passem por cima delas, ou identificar oportunidades de aumentar seu espaço no mercado. Para isso, devem agir mais rápido que as concorrentes. Com o mundo hiperconectado podem redesenhar a proposição de valor para seus clientes. Podem criar novos modelos de negócio, nos quais produtos digitais substituam produtos físicos. Um exemplo é a mídia impressa, que passou de ator principal a uma extensão da mídia digital, acessada por tablets. Os jornais terão de investir mais e mais em inovações no mundo digital. O resultado será uma mudança nas estratégias de negócio. O conteúdo digital, antes gratuito, está cada vez mais atrás dos chamados “paywalls”, ou seja, são pagos pelos seus assinantes.
Outras indústrias podem usar a tecnologia para otimizar seus produtos físicos. A indústria automobilística é uma delas, utilizando sensores para detetar pontos cegos ao motorista. Este mesmo segmento pode criar novos serviços baseados no mundo digital, ofertando serviços de auxílio no trânsito, diagnósticos em tempo real e apoio em emergências.
A revolução digital também pode transformar a maneira de como a empresa opera. Um exemplo interessante é o da Tesco, que criou um aplicativo que permite aos clientes escanearem o código de barra dos produtos que querem comprar, seja em suas próprias casas ou objetos que viram na casa de um amigo, e adicioná-lo automaticamente à sua lista de compras. O caso de sucesso pode ser visto aqui.
Ok, e como ir em frente? Minha sugestão: o primeiro passo é entender e identificar as oportunidades que a revolução digital pode trazer aos seus produtos e serviços. Não reagir contra.
Em seguida, é essencial redesenhar a proposição de valor aos seus clientes. É a resposta ao “o que fazer”. Simultaneamente, construir o modelo operacional que sustentará esta nova proposição de valor. É o “como fazer”. E executar e avaliar o processo continuamente.
Em 2008, a indústria da mídia não imaginava que a ameaça dos tablets surgiria no ano seguinte…
Monitorar as potenciais tecnologias disruptivas é essencial para a sobrevivência corporativa. Enfim, o desafio bate em nossa porta. Temos a opção de pensar que a revolução digital não vai nos alcançar – o que, com certeza, será uma decisão errada – ou aproveitar a oportunidade!
FONTE: IDG NOW