Uma marca icônica para as famílias brasileiras e uma ideia irreverente na cabeça. Assim nasceu a Gina Indelicada no Facebook. Criada há menos de um mês, a página já conta com quase dois milhões de seguidores, números dignos de grandes companhias. A empresa Rela Gina, proprietária da marca de palitos, vem estudando uma parceria com o criador do perfil, o estudante de publicidade Rick Lopes. Apesar da repercussão, especialistas atentam para o risco deste tipo de interação nas redes sociais.
O sucesso da página acabou empurrando a fabricante de palitos para as redes sociais. A marca até então esquecida pelos brasileiros precisou estudar uma negociação de parceria para administrar a visibilidade instantânea. Os números de seguidores estão equiparados a fan pages como a do Guaraná Antárctica, Heineken, Nestlé e Coca-Cola Zero.
Apesar de considerarem uma possível parceria entre o estudante e a Rela Gina como uma excelente oportunidade para gerar interação na internet, especialistas chamam a atenção para a linha tênue que divide o humor do tom ácido utilizado nas respostas do perfil e o que pode ser considerado ofensa pelos internautas.
Estilo alinhado à marca
O estilo utilizado na linguagem deve estar alinhado ao DNA da marca e precisa ser bem analisado antes de se pensar em parcerias utilizando o conteúdo produzido pelos internautas nas redes sociais. “Apesar de gerar uma excelente visibilidade, é preciso observar até que ponto o que está sendo colocado não fere a imagem e avaliar os riscos. Em alguns casos, o que é criado pelos consumidores é tão bem feito que acaba gerando um grande awarness de marca e, aí sim, deve ser aproveitado”, explica o CEO da E-Life Alessandro Barbosa em entrevista ao Mundo do Marketing.
A espontaneidade do ambiente social permite a criação de sucessos instantâneos, já que os internautas buscam a diversão e a irreverência. O sucesso de Gina Indelicada está ligado à própria marca, que há mais de 60 anos se apresenta da mesma forma e não conta com uma interação com os consumidores. A única ação desenvolvida pela Rela Gina no ambiente digital é o website, que apresenta apenas informações sobre a empresa e seus processos produtivos.
Marcas obrigadas às parcerias
Muitas vezes o sucesso dos conteúdos produzidos por terceiros acaba obrigando as marcas a seguirem o mesmo caminho. “É uma situação que acaba levando a empresa para a parceria. Neste caso, fazer algo contra acabaria gerando uma antipatia, já que a personagem caiu no gosto das pessoas. A marca pode sim usar o perfil como uma forma de Marketing, mas usar este tipo de posicionamento é arriscado”, diz Renato Abdo, especialista em Social Media e CEO da Sneezy.
As marcas podem criar ações semelhantes, mas devem estar focadas com a sua linha de posicionamento. A irreverência pode ser utilizada por empresas voltadas para o público jovem ou cuja imagem permita a utilização deste tipo de linguagem. “Isso funciona muito bem vindo do consumidor, mas não funciona de forma tão interessante quando parte diretamente das marcas. Não é tão natural. É importante que, caso se opte por este tipo de posicionamento, ele esteja totalmente ligado ao estilo da marca”, afirma Abdo.
Um exemplo de ação que perdeu a naturalidade quando relacionada a uma empresa foi a série de vídeos “Perdi meu amor na balada”, lançada pela Nokia. A ideia, que no início foi bem vista pelos internautas, que chegavam a torcer para que os dois personagens se encontrassem, acabou repercutindo mal para a empresa quando foi revelado tratar-se de um viral. Muitos consumidores não gostaram da iniciativa e criticaram a marca nas redes sociais.
O resultado mostra que o público prefere aquilo que é gerado de forma espontânea pelas pessoas. “É preciso cuidado por que, se a situação não for bem conduzida, pode acabar tendo um efeito contrário. Dependendo da situação, o conteúdo pode levar atributos ruins”, conta Renato Abdo.
Brincadeiras são comuns
A utilização das marcas para brincadeiras no ambiente social não é algo incomum. Activia, Johnnie Walker e Mastercard já enfrentaram esse tipo de situação e usaram as ações de forma bem humorada. “As marcas precisam saber lidar com isso, porque o embate pode acabar negativando a imagem. O posicionamento deve ser feito apenas em algumas situações, nos quais os valores são feridos”, explica Pedro Ivo Resende, Diretor-Executivo da Riot, em entrevista ao portal.
Seguir as tendências criadas pelos internautas é um caminho que pode ser usado pelas empresas, no entanto, não é algo fácil, já que, geralmente, tratam-se de modismos passageiros. “São sucessos imprevisíveis e muito rápidos. Esse tom ácido usado por Gina Indelicada pode ser seguido, mas implica em muitos riscos”, afirma Resende.
O ponto positivo de Gina Indelicada, além do humor, foi a capacidade de produzir visibilidade para a Rela Gina que, apesar de estar presente em boa parte dos lares brasileiros, quase não era notada. Mesmo gerando presença nas redes sociais, o posicionamento não agrega quando o assunto é construção de marca.
Valor para a marca
O boca a boca digital chama a atenção, mas não traz valor. “Usar o Facebook como construção de marca não traz benefícios. Usar apenas a graça pela graça não contribui. Pode-se sim pegar carona nesse posicionamento, mas o benefício maior é para o criador de Gina Indelicada, não para a empresa. O único benefício é o fato de ser uma marca que estava esquecida e agora é conhecida por todos. Isso só aumenta a lembrança, porém, sem levar nenhum benefício”, pondera Marcos Machado, Sócio-diretor da Top Brands, ao Mundo do Marketing.
Em uma sociedade onde se pratica cada vez mais o chamado Open Brand, onde as marcas deixam de pertencer às empresas para fazerem parte do que é produzido pelo consumidor, o melhor caminho é sempre investir na parceria para tirar o melhor proveito da situação. Evitar atacar diretamente o internauta é a melhor opção. “A situação é inevitável. O importante é que a marca analise se aquilo vai contra o seu DNA antes de agir, mas atacar nunca é o melhor caminho. Vejo sim a possibilidade de uma marca desenvolver uma ação como essa, mas não é algo fácil. Apesar de não parecer, o Marketing no Brasil ainda é conservador e tem medo de arriscar”, conta Marcelo Trípoli, CEO da iThink, em entrevista ao Mundo do Marketing.
Apesar de não verem ganhos em termos de construção de marca para a Rela Gina a partir da Gina Indelicada, executivos de Marketing acreditam que a associação pode resultar em maiores vendas para a empresa por conta da visibilidade dada à personagem, mas não enxergam vantagens concretas em termos de branding.
Sucesso passageiro
O sucesso da ação no Facebook pode ser passageiro, como no caso da “Luísa, que está no Canadá”. O bordão ganhou destaque na mídia, resultou em parceria entre a estudante e o Magazine Luiza, no entanto, não foi longe e acabou esquecido pelo público. Para analisar a repercussão de Gina Indelicada, a empresa CRM Social elaborou uma pesquisa nas redes sociais e concluiu que a personagem desperta sentimentos antagônicos de amor e ódio: 45% dos internautas consideram a ação positiva, 18% acham negativo, enquanto 37% se mantêm neutros diante do fato.
Ações desse tipo geram visibilidade, porém, sem engajamento. “Popularidade não significa engajamento. A utilização desse tom é algo complicado para a marca e pode resultar em prejuízos. As redes sociais são espaços sensíveis e que precisam ser trabalhados com cuidado. É necessária uma análise cuidadosa e coerente antes de se fazer uma ação dessas, porque utilizar esse tipo de posicionamento é muito arriscado”, alerta José Jarbas Pereira Jr, Diretor da CRM Social, ao Mundo do Marketing.
FONTE: Mundo do Marketing